Com juros altos, classe média reduz padrão de imóvel

Com juros altos, classe média reduz padrão de imóvel

 

 

Com juros altos, classe média reduz padrão de imóvel


 

Apartamento ideal, com três quartos na Zona Sul, é sonho distante para famílias com renda abaixo de R$ 10 mil


 


 

MAURÍCIO DE SOUZA

CONSTRUÇÃO

Saída: clientes estão optando por pagar parte do valor do imóvel às construtoras durante a obra

 

Imóveis caros e juros nas alturas estão obrigando a classe média a reduzir o padrão de qualidade do primeiro apartamento. Morar na Região Centro-Sul, ou comprar um apartamento acima do simples, é um sonho cada vez mais difícil de se concretizar. Para famílias com renda inferior a R$ 10 mil, e que não possuem poupança para a entrada, os financiamentos oferecidos por bancos públicos e privados são suficientes apenas para a compra de apartamentos de padrão popular, equivalentes aos incluídos no programa Minha Casa, Minha Vida.


O problema está na recente escalada dos preços dos imóveis, nos juros dos financiamentos e no teto legal de comprometimento da renda com o pagamento das prestações, de 30%. Essa conjunção de fatores impede a contratação de financiamento acima de R$ 260 mil para famílias com renda abaixo de R$ 10 mil, enquanto o imóvel padrão desejado por essas famílias (três quartos em bairro de classe média), hoje, não custa menos que R$ 400 mil.


Atualmente, estão colocadas duas opções de crédito imobiliário pelos bancos públicos e privados. Uma delas é o Minha Casa, Minha Vida, programa federal voltado para famílias com renda inferior a R$ 4,9 mil, com juros subsidiados e recursos provenientes do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Nesse caso, só podem ser financiados imóveis de até R$ 150 mil, dentro de Belo Horizonte, ou de até R$ 130 mil, nos demais municípios da Região Metropolitana. As taxas de juros variam de 4,5% e 8,6% ao ano.


Financiamentos com fonte na poupança


Já para a classe média, com renda familiar acima dos R$ 4,9 mil, os financiamentos imobiliários têm como fonte de recursos a poupança e oferecem juros regulados pelo mercado, que variam de 8,4% e 12% ao ano, seja nos bancos privados ou estatais. Os bancos financiam entre 70% e 80% do valor do imóvel, a depender da instituição financeira. Os prazos máximos de financiamento variam de 25 a 30 anos.  


Para levantar quais imóveis estão ao alcance da classe média, uma série de bancos foi consultada e fez simulações de financiamento para duas famílias hipotéticas, com perfis de renda distintos: R$ 6 mil e R$ 10 mil. Nos dois casos, o objetivo era a compra de um imóvel de R$ 400 mil, com entrada mínima de 20%. O valor foi definido com a auxílio de técnicos da Câmara de Mercado Imobiliário, Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário (CMI Secovi), que apontaram ser esse o valor médio dentro dos parâmetros exigidos pela classe média: apartamento novo, com três quartos, em bairro de classe média da Região Centro-Sul de Belo Horizonte.


Nenhuma simulação mostrou ser possível a compra do imóvel. Para a família com renda de R$ 6 mil, que por lei poderia pagar prestações de, no máximo R$ 1.800, seriam liberados financiamentos apenas para imóveis com preços entre R$ 136 mil e R$ 155 mil, valores equivalentes aos dos imóveis do Minha Casa, Minha Vida, que podem custar até R$ 150 mil, mas nos quais os juros anuais são, no mínimo, a metade dos pagos nos financiamentos de mercado. Já as simulações para a família com renda de R$ 10 mil, os valores liberados pelos bancos giraria entre R$ 230 mil e R$ 260, já que o valor da prestação não poderia ultrapassar R$ 3 mil.

Crédito mínimo deveria ser de R$ 350 mil


O diretor do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) e presidente da Câmara da Indústria da Construção da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Teodomiro Diniz Camargos, explica que esse valor não atende aos anseios da classe média mineira, que necessitaria de algo em torno de R$ 350 mil para adquirir um imóvel sem luxos, mas de bom acabamento e localização. 


“Isso acontece porque o crescimento da renda se deu em velocidade menor que a da valorização dos imóveis. Há dois anos, esses valores de financiamento seriam suficiente para atendê-las”, afirma. 


Para driblar o descompasso entre o desejo da casa própria e a oferta de crédito, muitos clientes estão optando por pagar uma parte do valor do imóvel às construtoras durante o período da obra, financiando apenas o restante nos bancos. É o que está acontecendo em um dos empreendimentos de Camargos no Bairro Luxemburgo, em Belo Horizonte. “Estamos construindo um edifício com apartamentos que custam R$ 500 mil. Muitas pessoas estão pagando ao longo da construção. Vão quitar uns R$ 150 mil durante os dois anos de obra para depois pagar o restante de outras formas, inclusive com financiamento bancário”, diz.


Segundo o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira, para as pessoas que ganham entre R$ 4,9 mil e R$ 10 mil a única solução seria trabalhar para fazer uma reserva de dinheiro para dar como entrada ao financiar de um imóvel mais caro.


“Não há alternativas. Ou se faz um pé de meia, ou não se consegue comprar o imóvel que quer”, afirma.


Mas ele admite que essa alternativa exclui a nova classe média, que ascendeu socialmente em função do bom momento econômico que atravessa o país, mas que ainda não teve tempo para fazer reservas financeiras. O que poderia resolver totalmente a situação, segundo ele, seria o aumento dos prazos de financiamentos, que hoje estão entre 25 e 30 anos.


“O Governo está tomando medidas para reduzir o crédito entre os produtos de pagamento a curto prazo, como automóveis, que não passam de 36 meses. Mas, deveria fazer o contrário no mercado imobiliário”, disse

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