Cobrança de "aluguel" pode surpreender dono de imóvel litorâneo

09-11-2010 10:06

Brasília, DF - A Secretaria do Patrimônio da União (SPU) iniciou por Santa Catarina, e deve estender para áreas litorâneas e ribeirinhas de todo o País, a redemarcação das extensões denominadas “faixas de marinha” (e não da Marinha nacional). Por lei, as pessoas que possuem imóveis na abrangência dessas faixas devem pagar à União uma espécie de aluguel, denominado “fôro”. 

De acordo com o especialista no tema, advogado Roberto Pugliese, é provável que a redemarcação inclua inúmeros imóveis na listagem dos bens patrimoniais que ocupam perímetros (faixa de marinha) considerados da União, portanto, sujeitos ao pagamento de aluguel para o governo. 

Conforme as leis atuais, o proprietário de imóvel que é (ou venha a ser) listado como bem da União não corre qualquer risco de perder a titularidade. “Apenas”, passará o resto da vida pagando ao governo o aluguel de um bem que lhe pertence, por direito de compra ou de posse. Um entre os questionamentos levantados por Pugliese diz respeito à forma como está sendo conduzido o processo de redemarcação.

"Os proprietários de habitações ou terrenos que, por força da redemarcação, forem enquadrados como imóveis sujeitos ao pagamento do fôro serão intimados por publicação no Diário Oficial da União (DOU), o qual, convenhamos, não faz parte da leitura rotineira da população. Além de ser levado a ignorar o processo ao qual está submetido, o proprietário do imóvel corre o risco de perder o prazo para a contestar o resultado da redemarcação”, comenta o advogado.

”Desconhecer o fato significa também ignorar a dívida de aluguel junto à União, o que levará o proprietário do imóvel a ser inscrito no Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de Órgãos e Entidades Federais (Cadin), com resultados nefastos para a sua rotina de cidadão”, alerta Pugliese.

Faixa de marinha é definida por marolinha de 1831 – No litoral e em terras ribeirinhas de todo o País, a demarcação que define faixa de marinha utiliza como ponto de partida a preamar média do ano de mil, oitocentos e guaraná de rolha (leia-se 1831). A medição é feita em locais onde as oscilações das marés do oceano, rios e lagos alcançaram cinco centímetros, à época e no mínimo. Estabelecido este cenário, uma linha imaginária de 33 metros determina a extensão da faixa de marinha.

Tomando por base o litoral catarinense, por onde o SPU inicia a redemarcação, atualmente ultrapassa a 27 mil o número de imóveis cujos proprietários são sujeitos ao pagamento de fôro para a União, muitos deles inadimplentes. A causa: reajustes aplicados em 2007, com acréscimos que chegam a 1.300%.

“Na verdade, utilizando como referência a preamar média de 1831 (Lei 9.636), a União não tem como provar que o imóvel está em faixa de marinha. Quem move ação na Justiça obtém sucesso”, diz Roberto Pugliese, que percorre o Brasil para ministrar palestras de esclarecimento e orientação aos interessados. 

Em ponderações acerca do tema, a Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (Arisp) menciona pesquisa realizada pela Fundação Armando Álvares Penteado, segundo a qual “nas perícias que envolviam imóveis limítrofes ao mar, 99% dos casos não apresentavam possibilidade legal de demarcação, uma vez que a lei vigente estabelece uma linha demarcatória atrelada a um fenômeno natural de 1831”.

Aos proprietários de imóveis litorâneos e ribeirinhos, Roberto Pugliese recomenda atenção às edições do Diário Oficial da União, onde serão publicadas as intimações para os novos inquilinos. “As pretensões da União devem ser impugnadas ainda durante o processo administrativo”, diz o especialista. 

Proprietários desconhecem dívida; SPU (ainda) não conhece todos os devedores – Atualmente, no momento da emissão da certidão de propriedade, os cartórios não indicam no documento se o terreno pertence às faixas de marinha. Resulta que inúmeros proprietários de imóveis, litorâneos e ribeirinhos, desconhecem a condição de suas propriedades enquanto imóveis foreiros, portanto, sujeitos ao pagamento dealuguel para a União. 

Por sua vez, a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) não sabe, ao certo, quem adquiriu imóvel em tal condição. O fato se dá porque governo e cartórios discordam sobre de quem é a responsabilidade em checar a informação, que deveria constar na escritura. A Arisp comenta que, através de nota, a diretoria do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado do Espírito Santo atribui àquela secretaria tal responsabilidade - e destaca: “É a própria SPU quem, em prejuízo de um grande número de cidadãos e da própria União, não vem cumprindo a legislação”.

Ainda conforme comentado pela Arisp, desconhecer a condição foreira do imóvel comprado não isentará o proprietário de pagar aluguel à União. “Recentemente, a polêmica do pagamento de taxas (sobre uso de faixa de marinha) chegou aos tribunais. Decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) entende que, mesmo quem comprou o imóvel sem saber que a área é de marinha, terá de pagar a taxa. O valor será cobrado de forma retroativa”, alerta a Arisp.

Além das orlas marítimas, a condição de faixa de marinha abrange, por exemplo, fazendas de gado, quilombos, redutos de pesca e aldeias ribeirinhas às margens do Rio Ribeira do Iguape, do São Francisco e outros, do Oiapoque ao Xuí.

Fonte R7 Imoveis

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